Centro nacional de bioenergia tem 1ª mulher presidente em 42 anos: veja os planos da nova dirigente do Ceise Br
03/01/2023
Empresária do setor de transportes e logística, Rosana Amadeu Silva vai liderar órgão entre 2023 e 2024. Ao g1, ela cita atenção a conjuntura econômica internacional e à transição política nacional, além de destacar oportunidades de negócio com a demanda da transição energética.
Pela primeira vez em 42 anos de fundação, o Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (Ceise Br) terá uma mulher no comando.
Empresária do setor de transportes e logística, Rosana Amadeu Silva tomou posse em dezembro para assumir, até 2024, a presidência da entidade em Sertãozinho (SP) que representa mais de 500 indústrias de todo o país e é uma das responsáveis pela Fenasucro, considerada a maior feira de bioenergia do mundo, que acontece há cerca de 30 anos no interior de São Paulo.
"Não é fácil ser mulher em locais de poder. Nós temos a nossa jornada dupla, tripla, com filho, família, também no nosso ambiente profissional desempenhando o papel da melhor forma que a gente puder. Tenho realmente a honra de representar a força feminina nesse ambiente", afirma Rosana.
Além da importância da liderança feminina na indústria, ao fazer projeções para 2023 a nova presidente do Ceise Br destaca, em entrevista ao g1, um cenário de mudanças políticas, de transição energética e questões de ordem internacional que influenciam o setor industrial brasileiro.
Ela também enfatiza a necessidade de se fortalecer o Renavabio, a Política Nacional de Biocombustíveis, lançada em 2016.
"O que a gente espera: que em 2023 tenhamos um Renovabio com total apoio, que continue sendo forte, que as diretrizes do programa e os motivos pelos quais ele foi elaborado recebam um olhar especial e que a gente possa seguir com essa trajetória."
A nova presidente do Ceise Br
Rosana é formada em letras, mas fez sua carreira profissional em indústrias ligadas ao setor sucroenergético, acumulando experiência em transportes e logística, além do antigo Banco Nossa Caixa e e da Prefeitura de Sertãozinho, onde nasceu.
Antes de ser aclamada presidente para o biênio 2023/2024, em eleição realizada em outubro, ela atua na diretoria executiva do Ceise Br desde 2017, tempo em que ampliou seu contato com as demandas do segmento que agora representa
Liderança feminina na indústria
O papel feminino na indústria e em entidades setoriais, na visão da presidente, é uma tendência, apesar de ainda não ser uma realidade em âmbito global.
"Estamos tendo essa oportunidade, infelizmente nem todos os países dão essa oportunidade. A gente vê pelo mundo coisas absurdas acontecendo com as mulheres, mas a participação feminina está ganhando cada vez mais espaço", diz.
Isso fica cada vez mais expressivo, segundo ela, nas discussões conduzidas em grandes eventos como a Fenasucro como o 'Cana Substantivo Feminino', que em 2022 tratou de ações para ampliar a presença feminina na agroindústria canavieira.
"A participação das mulheres no agro e nos ambientes que antes realmente eram essencialmente masculinos ganhou muita força."
Apesar de ser a primeira mulher na presidência, ela destaca outras figuras femininas importantes que a antecederam e ajudaram a escrever a história do Ceise Br.
"O Ceise surgiu no momento de turbulência, entre greves de metalúrgicos, em que os empresários e os sindicalistas não tinham muito diálogo. Então a entidade venceu muitos obstáculos, impondo-se com respeito e credibilidade e, nesse processo, em constante evolução, tivemos sim antes de mim algumas mulheres que foram pioneiras na história da entidade. (...) Porque naquele momento era um ambiente basicamente masculino. Podemos citar Maria Aparecida Zeferino Marcolino, Maria Conceição Ferreira Turini, Maria Lúcia Daniel Jorge. E de lá pra cá nós tivemos outras mulheres na diretoria."
Dos 20 membros da nova comissão a assumir o Ceise, apenas quatro são mulheres. Mas, segundo Rosana, elas têm um papel fundamental.
"Todas elas têm muito a contribuir e muito acrescentar para que o olhar feminino possa contribuir, possa agregar, possa promover uma gestão humanizada, possa promover a aproximação dos nossos associados, aumentar o número de associados, eu acho que todo esse toque feminino faz bastante diferença."
Pautas do setor
Além do fomento de negócios, da busca por mais associados e por parcerias estratégicas com outras entidades, como Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), Sebrae e União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), Rosana quer estar atenta a assuntos de âmbito político e econômico que interfiram na indústria sucroenergética, em especial o Renovabio.
Para 2023, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) estabeleceu um total de 37,47 milhões de créditos de descarbonização a serem adquiridos pelas distribuidoras de combustíveis no Brasil.
"Estamos esperançosos que os nossos governantes tenham sabedoria e não desidratem a Lei 13.586/17, que instituiu o Renovabio, que é a política nacional dos biocombustíveis."
Além do Renovabio, a nova presidente do Ceise Br vislumbra como temas prioritários a integração internacional de novas tecnologias desenvolvidas no Brasil e a disponibilidade de linhas de financiamento para o fomento ao setor industrial.
Por isso, na avaliação dela, é primordial acompanhar o processo de transição política brasileira e as decisões federais que serão tomadas a partir do ano que vem.
"Esperamos que o dinheiro do nosso país possa ser bem direcionado, que o BNDES possa fazer um trabalho correto e justo em prol das nossas indústrias."
Nesse contexto, também será importante atentar para a conjuntura econômica internacional, com destaque para os mercados norte-americano e europeu, para as oscilações nas taxas de juros e no câmbio, e para o que será possível fazer para proteger a indústria sucroenergética.
"A nossa entidade vai estar com esse olhar específico, defendendo os interesses das empresas associadas, participando dessas principais discussões, e muito atento para atuar firme no nosso segmento, buscar soluções e mitigar todos os obstáculos que forem possíveis."
Transição energética e negócios
Palavra de ordem nos acordos internacionais sobre o clima, a transição energética não só é uma tarefa obrigatória para o cumprimento das metas globais como também canaliza negócios para as indústrias ligadas à cana-de-açúcar, que estão em evolução para acompanhar o ritmo das mudanças, avalia a presidente do Ceise Br.
"As nossas indústrias são muito preparadas e têm total condição de dar conta de tudo isso que tem por vir."
Nesse contexto, o etanol, o biometano e o hidrogênio verde - já apelidado de "combustível do futuro" e obtido a partir da água residual da indústria da cana e da quebra das moléculas do álcool - são apontados não só como importantes soluções renováveis para o processo global de descarbonização, como também viáveis, mesmo em momentos de crise, como os causados pelo conflito entre Rússia e Ucrânia.
"A nossa percepção é que a guerra na Ucrânia não impacta diretamente no nosso mercado, visto que esse países dependem dos combustíveis fósseis", argumenta a presidente.
Esses são alguns dos motes que, na visão da presidente, proporcionam oportunidades de ganhos para toda a cadeia sucroenergética, desde o preparo do solo ao plantio, dos processos de automação industrial à logística.
Em 2022, a Fenasucro & Agrocana registrou um movimento de R$ 5,2 bilhões em contratos de vendas com uma visitação de quase 50 mil pessoas a Sertãozinho. Em 2023, a feira acontece de 14 a 18 de agosto.
"Ao longo dos anos esse segmento agregou outros elos da cadeia produtiva e a ideia é realmente integrar informações técnicas, socioeconômicas desse cenário todo produtivo do sucroenergético e essas várias tecnologias e inovações apresentadas pelas indústrias, sobretudo na feira."